17.2.15

ATENÇÃO

Podias parar de reclamar a minha atenção.
Ficas tão centrado na minha ausência que nem, quando estou, me deixas estar. Todos os nossos assuntos ficaram resumidos ao tempo que desperdiço fora de ti.
Sabes que todo o tempo que bate neste relógio é meu? Disse-te desde o início. Se não ouviste as badaladas não foi por não terem soado mas porque o teu relógio conta mais os meus minutos do que marca os teus compassos.
Não sei dançar assim. Tu não me danças, atropelas-me. Gastas a sola toda dos teus sapatos novos neste tango e não vamos a lugar algum se a rosa que trazes na boca murchar.
As nossas conversas também estão secas. Cortaste, pela raiz, todas as palavras que tinha nos lábios e deixámos de falar a mesma linguagem. Ainda temos expressão e gestos.
O movimento do meu corpo também revela. Se não te esconderes no negativo talvez consigas a luz certa para o meu retrato. Só não consegues fotografar o gosto que o meu corpo tem, nem sentir-lhe o cheiro ou tocar-lhe a pele.
A minha imagem podes guardar no bolso do tecido que te cobre. É a única forma que tenho de te vestir de sentido sem voltares a afirmar em voz de comando: “Atenção!”.

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